terça-feira, 29 de junho de 2010

Que saudade da cana do vovô

Caldo de cana é uma iguaria típica desse nosso país varonil. Uma bebida tão doce e saborosa rivalizada apenas pela bebida dos deuses, o ambar mel colorido conhecido mundanamente como ambrosia, ainda mais se estiver gelada, o que quase justifica todas as chicotadas no lombo que os afrodescendentes de cor preta tomaram durante anos para cortá-las com esmero e entregar cabisbaixos a seus patrões portugueses. Não se faz uma grande nação sem gotas de sangue. Fato que os ancestrais de Cristiano Ronaldo tinham em mente nosso bem estar em eras vindouras. Visonários como só os lusitanos, sabiam que séculos depois viriamos a desfrutar do direito de degustar desse fino líquido em qualquer esquina junto a um brilhoso pastel de queijo. Pode ser de carne. Aqui no Tortura Cidadã não imponho nada e não manipulo informação.

O gozo de sorver uma cana liquefada não vem apenas de te-la esmagada até o puro sumo. Não. Há um pulo do gato tipicamente brasieliro, malandragem que a nobreza de nosso ancestrais europeus nunca os permitiria entender. O caldo da cana por si só é gostoso pero no mutcho. Apenas um líquido adocicado que perde para qualquer manga rosa. O gosto especial, aquela leve gosmência viciante que nos faz tomar mais um gole e mais um, mesmo estando de dieta ou sendo diabéticos, vem do ingrediente secreto que só a hermética maçonaria dos vendedores de caldinho conhecem e aprimoram durante gerações. Segredo sinistro tal qual o dos templários, é a sujeirinha que se acumula nas engrenagens do aparelho moedor da cana que dá o toque mágico. O dendê das galáxias. Como caros queijos que são deixados para apodrecer e encher de mofos que degustamos como se fosse fina iguaria. Dentro das engrenagens de uma máquina de caldo tem pedaços de cana, baratas, pelos de gato e qualquer coisa que vá parar ali. Ninguém limpa mesmo. Sabe aquele cara legal que te vende um super caldo levemente melhor que os outros e de uma cor levemente diferente? Pois é. Podem ser gotas de suor com o PH levemente alto.

Mas não venho aqui demonizar o caldinho. Jamais. Acho que faz parte de nossa cultura fantástica e por respeito e gratidão a todos que sofreram açoites e ralaram para manter viva a produção de cana no brasil, devemos beber em tom de brinde. Cheers!

O segredo da máquina me foi revelado por um amigo que já se foi, vítima da máfia dos caldos. Foi eliminado por estar tirando a clientela da feirinha das terças feiras. Porém não antes de me confidenciar o jump of the cat. Falou que estava tendo dificuldade em encontrar uma máquina de caldo. Tinham até várias anunciadas em jornais, mas não serviam por serem novas demais, limpas. Máquina boa só depois de um ano de uso, sem limpeza. É assim que os doutores gostam, insinuava ele.

Devo ressaltar certa ironia nefasta presenciada na época das eleições de anos atrás (não faço referência a eleição de um presidente semi analfabeto), aonde um famoso e popular vendedor de cana se candidatou a certo cargo político. Ele era querido pelo bairro todo e tinha mais do que certeza de que seria eleito. Porém, ao final das apurações sempre idôneas de urnas eletrônicas, ele não totalizou nem dez votos. Comentava-se a boca pequena que sabiam ser ele um cara íntegro e sério, pontual e consciente das necessidades do povo, mas se fosse eleito teria que abandonar a barraquinha. E sem o caldo de cana do fim de semana não poderiam viver felizes.

Com grandes poderes vem grandes responsabilidades.

Lembro de minha época de pequena criança, de menino maroto travesso correndo descalço e semi nu como um curupira de pés tortos, ansioso pelos pedaços de cana que vovô trazia. Era um balde cheio daquelas madeirinhas amarelas adocicadas que eu mascava sem o menor acanhamento até os músculos do maxilar ficarem dormentes. Também, jovem que era, nem me importava com o caseiro que me vigiava, morto de fome, enquanto eu degustava todos os cubinhos sem a menor solidariedade.

Quando a gula acabava, porque fome em nenhum momento norteou minha comilança, continuava mesmo assim a ruminar os cubiculos pelo simples prazer primitivo da mastigação. Já não aguentando engolir mais caldo, eu cospia o líquido excedente no chão como um bom striker de baseball, numa alusão a minha tendência norte americanizada de comportamento.

Ao fim, ficava o caseiro limpando meus cuspes e revirando o balde cheio de palhas comidas de cana, atrás de algum pedaço ainda inteiro, enquento eu boiava, barrigudo e feliz na piscina do sítio.

Que saudade da cana do vovô.

2 comentários:

  1. Nico,

    realmente o caldo de cana é uma bebida fantástica, se minha querda professora da academia me permitisse tomar isso todas terças após meu treino, talvez minha saúde fosse muito melhor... Mas não digo isso atoa...

    vamos lá:

    Se partirmos do princípio que devido à excelente higienização da máquina nós somos obrigados a ingerir algumas coisas não muito saudáveis, como coliformes, bactérias, fungos, e alguns insetos que andaram em locais "super limpos", como baratas e formigas (inseto mais sujo que existe e ninguem da a mínima pra isso, só ligam pras baratas... e pior, comem a formiga e dizem: "Ahh, faz bem pros olhos...", só esquecem que esta mesma formiga estava comendo a barata morta, o lixo, etc... hehe), temos sorte de ingerir um remédio tão bom, pois graças ao caldinho de câna nós temos uma imunidade muito maior!

    Como as doses de sujeira são baixas e variadas, e ingeridas algumas ou uma vez por semana, de forma quase periódica, nós temos um efeito muito interessante...

    Outro dia vi um documentário de um cara que criava cobras pra extrair o veneno... ele simplesmente se injetava com uma dose risícula de veneno das mais de cobras para que seu corpo começasse a criar imunidade!!! e o melhor, dá até p fazer soro antiofídico com o sangue dele!!!

    Uma curiosidade: Foi feita uma pesuqisa pela UNICAMP onde provaram uma série de benefícios do caldo de cana na recuperação muscular e reposição energética (óbvio... é açucar neh...) de atletas, onde o grupos que ingeria Garapa após o treino obteve desempenho superior à quando não ingeriam... maiores detalhes se encontra no google (pesquisar: garapa atletas)

    Logo, que o caldo de câna continue sempre nos beneficiando assim!!!

    \o/\o/\o/

    Le.M.Berg

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  2. Caldo de cana é uma bebida fantástica que deve continuar sendo degustada por todos os brasileiros. Meu post nada mais é do que uma homenagem a essa iguaria tropicana

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